Fim da estabilidade para servidores públicos?

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Por Ana Beatriz Rodrigues 

Certa vez vi um vídeo de Leandro Karnal falando sobre a diferença entre a
cobiça e a inveja: o ser humano, quando tem inveja, se enraivace com a
conquista do outro. Não acha justo nem certo que o outro consiga ter ou ser
aquilo que ele não dá conta. Acho impossível falar sobre estabilidade sem falar
de inveja.

É muito comum que achem injusto que o funcionário público concursado tenha
estabilidade porque na iniciativa privada, onde essas pessoas que reclamam
costumam estar, não existe isso. É triste ver que existem pessoas que querem
igualar uma atividade que visa lucro às atribuições do Estado que, em sua
maioria, consiste em prestação de serviços a sociedade.

Bateram palmas para o agente público que multou o desembargador. Onde já
se viu sair ileso só por ter poder?! Pedra deve ser pedra para Maria e para José.
Se não existisse a estabilidade ele não teria multado o desembargador porque
teria receio de perder seu emprego porque o cara tem influência e poder. Ele
perderia o emprego por cumprir sua função.

Muitos acreditam que estabilidade significa que o funcionário público se veste de
Sarney “daqui não saio, daqui ninguém me tira”, mas a realidade pode ser tudo,
menos isso. Basta consultar ao Diário oficial para ver as exonerações ocorridas
durante a “pandemia”(em aspas porque a fila que tinha para entrar no Rio Preto
Shopping esse final de semana era digna de uma estreia de Harry Potter. A fila
de carros descendo a serra nem merece comentários).

A estabilidade não significa vitaliciedade. Ela é garantia não do agente, mas do
cargo e é de suma importância para que a máquina estatal funcione. Sem ela os
agentes públicos estariam a mercê de seus superiores políticos. Seriam
obrigados a corroborar com fraudes e esquemas de corrupção para garantir o
seu emprego, de onde sai o seu sustento, e ainda assim correria o risco de serem
trocados por algum amigo do políticos X. Investigações como a lava jato jamais
teriam políticos presos em seu desfecho. Moro nunca teria vivido a fase de “herói
nacional” e nem teríamos o “japonês da federal”.

O funcionário público concursado não chegou ali porque fez alianças políticas ou
porque saiu com Fulano ou chantageou Beltrano. Ele está ali porque estudou
muito pra isso. Porque sabe e consegue mostrar que sabe.

Eles têm hora pra entrar, meta de produtividade pra bater e nem sempre têm
hora pra sair. Em troca eles têm a certeza do quanto vão receber e a segurança
de poder denunciar quem fizer algo ilícito.

Existem profissionais e profissionais em todos os setores.
Se você vai na festa da firma e dá o famigerado PT, no máximo vai virar meme.
Dificilmente isso, por si só, te trará grandes problemas. Já o servidor público
pode vir a perder o emprego por conduta escandalosa.

Se você sai pra almoçar, esquece de trancar sua sala e em virtude disso alguém
a invade e rouba um computador basta provar que não concorreu com o crime e
ainda pode dizer que a empresa vacilou na segurança. Se for visado pelo chefe
e perder o emprego, nada te impede de arrumar outro emprego na firma ao lado.
Essa mesma situação não ocorre com o funcionário público. Ainda que prove ser
100%inocente responderá administrativa e criminalmente por peculato culposo,
sendo condenado passará anos sem poder contratar com a administração
pública além de perder seu ganha pão.

Existem várias situações em que o agente público pode ser exonerado,
logicamente que a maior parte delas deve ser precedida de processo
administrativo/disciplinar. Há, ainda, hipóteses em que o cargo é extinto e corte
de gastos.

Sim, o Estado faz corte de gastos demitindo a galera que é concursada. Primeiro
cortam quem chegou agora e ainda está em estado probatório e depois os
efetivos.

Os servidores antigos gozam de direito adquirido e a eles não se aplica o fim da
estabilidade, mas tem-se facilitada a exoneração arbitrária por um processo
fraudulento.

Quem vai ganhar com a extinção da estabilidade para os novos concursados são
os políticos. Aqueles mesmos que roubam você diariamente. Que preencherão
o quadro de funcionários públicos os seus pares e não pessoas que batalharam
para ali chegar.

Você que luta pelo fim da conquista do outro vai continuar ganhando dois mil
reais por mês e pagando tributos exorbitantes enquanto um amigo de um cara
que tem poder vai estar ganhando quatro vezes mais que você sem ter sequer
estudado pra isso. Isso se, contar ausência de segurança e interesse em
desempenhar o papel.

Sobre a autora: 

Ana Beatriz Rodrigues tem 24 anos e é advogada criminalista. Coordena comissões de diversidade de gênero e de direito militar da OAB Mirassol, além de ser membro da comissão da jovem advocacia. É pós-graduanda em direito público e em direito empresarial. Considera-se apaixonada pelo direito e pela advocacia desde que iniciou os estudos na área, aos 16 anos, pelo Centro Paula Souza.