Por Ana Beatriz Rodrigues
“Desenvolvida para uma chave amigo-inimigo, nossa mente tende a rotular tudo o que vê, julgando a novidade de acordo com seu conhecimento prévio. Isso garantiu nossa vida por muitas gerações: se eu comer algo que me faz mal, toda vez que olhar para algo semelhante, sentirei repulsa. Nosso cérebro rotula de acordo com a percepção de nossos sentidos. Isso pode ser bom para evitar perigos, porém cria problemas para nossa atualidade.
Encerrar em caixas herméticas dá segurança. Começamos com a minha tribo e a do outro. Se é da minha, diminuem as chances de ataque. Classificar é a primeira forma de dominar e de se defender. O vício entrou em nós. Da tribo, passamos a gostos musicais e sexuais ou escolas artísticas. Classificar não é ruim ou errado. Supor que algo esteja controlado mentalmente por estar etiquetado é, no fundo, estupidez.”
https://cultura.estadao.com.br/noticias/geral,rotulo-logo-existo,70003042544
Ė com esse trecho de um artigo do Leandro Karnal que início o meu próprio.
Chegada a temporada do pastel com garapa, digo, de eleições. O Natal dos sádicos (aquele que sente prazer com o sofrimento alheio).
Foram quatro anos para o show de horrores e eu nem digo dos candidatos, principalmente os que têm coragem de tentar reeleição, – já que a noção é deixada para trás no ato de registro da candidatura – mas dos eleitores. Em 2014 a jornalista Ana Paula Padrão defendeu, em artigo, que ser gentil é um ato de rebeldia, devo concordar.
https://istoe.com.br/391399_GENTILEZA+VIROU+FRAQUEZA/
Enquanto segue o debate entre os candidatos no vídeo, na caixa de comentários uma guerra civil entre os eleitores.
Quando alguém envia uma pergunta para ressaltar a falha de alguém que está cumprindo mandato (mandado é o de busca e apreensão, expedido pelo juiz) vem outro eleitor respondendo de maneira agressiva e vazia, como quem se defende de uma ofensa pessoal, que o que questionou é burro, mal informado (é o meu favorito porque quem alega isso nunca é capaz de agregar conhecimento e boa informação a àquele que questionou. Xinga e some) ou que deveria ir pra Cuba. Nos últimos anos, me parece, que ir para Cuba se transformou na ofensa máxima. A caixa de comentários que deveria guiar um debate construtivo e visando o bem comum vira um campo fértil para ações de dano moral por crimes contra a honra. É mais fácil ofender quem questiona aquele que me prometeu alguma coisa do que parar para pensar que também serei prejudicado numa má gestão.
Inicialmente gostaria de ressaltar que estou aceitando passagem e hospedagem para Cuba, em especial Havana. Prometo escrever livros e gravar um vlog retratando todo meu sofrimento neste país tão ofensivo.
Por seguinte, gostaria muito de entender como funciona a cabeça do brasileiro médio. Reclama-se por anos de corrupção , que somos um povo demasiadamente virtuoso para termos os representantes que temos. Que temos que romper com a velha política. Um povo tão revoltado, mas que sempre cai no mesmo papinho e só piora. O governo é reflexo de seu povo.
Certa vez vi uma tirinha que mostrava uma evolução de pensamentos que passava de “quanta gente burra” para “quanta gente sem acesso à informação” e se encerrava em “quanta gente com acesso a informação e burra”. Nunca me senti tão representada.
Eleições parecem uma disputa para rainha do baile de outono. Disputa-se a popularidade, não importa o caráter, vida pregressa e projetos. Vou votar naquele cara porque vou ser beneficiado aqui ou ali. E é nessa vibe oportunista que muita gente se elege prometendo coisas que fogem da alçada do cargo almejado. Vote em mim porque eu prometo mais e mais bonito que ele. Me reeleja porque “nooossa tinha uma montanha no meio do caminho que eu nem te conto….assim, era um pedregulho de piche né, mas se você der um zoom, nooossa como fica grande e eu fui tão valente em tentar tentar que mereço né?!”
O cara quer ser vereador e promete coisas que competem a um governador, por óbvio ele não cumpre e ainda sai como errado. Promete fazer x coisa, só esquece de falar que na verdade vai buscar apoio porque não se faz nada sozinho. Ele só esta vendendo o peixe dele, errado é você que não se informa.
O cara descobre que o salmão que come é, na realidade, truta salmonada e quer brigar com o chef da temakeria sem saber que é impossível criar salmão no nosso clima tropical e que seria muito mais caro importar e que dificilmente o salmão original chegaria fresco. Francamente, errado foi você que votou sem nem saber o que poderia cobrar. Elegemos sem nenhuma noção de repartição de competências.
Independente do seu nível acadêmico, se você teve acesso a um 3g para ler o presente artigo pode muito bem fechar a guia e pesquisar o que cada cargo pode ou não fazer. Inclusive vou até deixar links bem didáticos para que entendam a importância e atribuições dos cargos em eleições municipais.
Como minha mãe sempre me dizia: se você não souber limpar a casa, jamais poderá contratar uma faxineira porque não terá como saber se ela está fazendo um bom serviço ou se está camuflado a sujeira e te passando pra trás. Quem não sabe fazer não pode cobrar.
Por fim, trago uma mensagem do ícone pop, que está em alta entre os memes desenterrados do jornalismo brasileiro, o Et Bilu: Busquem conhecimento.
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Sobre a autora:
Ana Beatriz Rodrigues tem 24 anos e é advogada criminalista. Coordena comissões de diversidade de gênero e de direito militar da OAB Mirassol, além de ser membro da comissão da jovem advocacia. É pós-graduanda em direito público e em direito empresarial. Considera-se apaixonada pelo direito e pela advocacia desde que iniciou os estudos na área, aos 16 anos, pelo Centro Paula Souza.