Quando tinha por volta dos meus 15 anos, uma série de obras literárias me foi apresentada na escola. Eram clássicos da literatura, de escritores que ficaram consagrados pela sua genial produção. Mas só me apeguei a eles mais tarde. Nessa época, foi o livro do suíço Erich Von Däniken, “Eram os Deuses Astronautas?”, que marcou minha adolescência. Ele trazia respostas para muitas perguntas. O céu, que aprendi a observar com meu pai, me causava espanto e motivava questionamentos, que longe de levar a uma resposta, me deixavam ainda mais perplexo: de onde vinha isso tudo? Por que é que nós existimos? Qual a origem da vida? Existe vida inteligente lá fora?
Nessa época, as respostas tradicionais já não me satisfaziam. Como explicar a existência de pirâmides gigantescas no Egito e na América, dois continentes distintos? O que dizer dos misteriosos Moais, da Ilha de Páscoa? E as quilométricas linhas de Nazca?
Depois de Von Däniken tudo fazia sentido, todas essas respostas estavam lá. Pelo menos durante um tempo. Hoje, apesar de pensar ser praticamente impossível estarmos sós num universo de tamanho impensável, não tenho como concordar com suas teorias, que defendem, entre outras coisas, que nos tornamos humanos com uma mãozinha de visitantes extraterrestres. Eles teriam, segundo o autor, impulsionado o processo de evolução da nossa espécie. Sem condições de compreender quem eram os amigos espaciais que desciam do céu em suas naves, nossos antepassados os tomaram por deuses.
O autor parte de questões legítimas, de profundidade e teor filosófico, mas a saída que ele aponta acaba sendo uma grande invencionice, que apoiada em linguagem pseudocientífica e misturando mito com história, consegue convencer muita gente. Assim funcionam as teorias de conspiração.
O ataque ao World Trade Center foi uma grande armação, dos próprios norte americanos? A viagem à Lua foi uma farsa? Já existe cura para o câncer, mas não é rentável à indústria farmacêutica? Os médicos cubanos são na verdade guerrilheiros comunistas disfarçados? A AIDS foi criada em laboratório?
Quando me deparo com teorias dessa natureza, me lembro de minha adolescência, um período marcado por inquietações, insegurança e desmoronamento das certezas que antes conseguiam dar certo sentido às coisas.
Freud apostou que a ciência substituiria a religião. O inventor da psicanálise acreditava que em um futuro próximo, o pensamento científico seria capaz de preencher todas as lacunas do conhecimento. Mas quem acertou foi Caetano, quando canta que “um porto alegre é bem mais que um seguro, na rota das nossas viagens no escuro.”. Quando a religião começou a perder crédito, criamos seres espaciais. Seriam eles agora responsáveis por ligar nossos breus e dar sentido aos nossos mundos.
A essência da ciência é medição e prova, e assim como a história, demanda tempo e estudo para serem entendidas. É muito mais fácil render-se a teorias baratas. Além disso, suportar os vazios, os lapsos de sentido que permeiam a existência, enfrentar o desamparo de viver sem seres fantásticos nos protegendo exige certa dose de coragem. A ciência é maravilhosa e segura, mas tratando-se de dar amparo espiritual ela é capenga. O porto seguro científico não substitui o porto alegre da religião.
Qualquer teoria, ainda que deficiente, acaba sendo preferível ao inexplicável. Por mais que a ciência avance, os mitos fantásticos parecem insistir em se pronunciar. Agora nos versos de Gil: “Não adianta nem me abandonar | Porque mistério sempre há de pintar por aí…”.